Passar por uma fusão e/ou aquisição (mais conhecidas como M&As) não é nada fácil. Eu nunca tinha pensado muito na possibilidade de passar por este tipo de processo, mas se algum dia pensei, achei que iria ser num período mais tardio da carreira. Porém com o trabalho no mercado brasileiro, que parece um turbilhão e está sempre a dar reviravoltas, isto acabou por acontecer mais rápido e intensamente do que eu pensava. Desta conta já lá vão três destes processos! Por isso resolvi compartilhar alguns conselhos que trouxe das minhas experiências (algumas "adversas"!) e que possam, eventualmente, interessar a pessoas que passam ou venham a passar pelos mesmos processos.
1º Não sofra por antecedência. Parece bastante óbvio, mas não é. Nestas andanças de fusões e aquisições aprendi que nem sempre os melhores profissionais (leia-se mais competentes) permanecem nas cadeiras onde estavam ou onde achávamos que deviam estar. Por isso não adianta muito passar horas sem dormir a pensar quem vai ficar neste ou naquele lugar. Estas mudanças ocorrem "teoricamente" para otimizar as empresas, seus resultados e consequentemente os mercados. Melhoram-nos porque nos trazem uma série de problemas para resolver (um leque de situações e reações que jamais pensávamos um dia passar - acreditem!) e com isso crescemos profissionalmente. Mas não necessariamente passamos para um estágio melhor da nossa carreira. Por isso bom mesmo é ficar "antenado" sempre.
2° Tire logo todas as tuas férias!Assim que decorram informações concretas sobre alterações previstas é bom rever o calendário de férias. Tanto o seu quanto o das pessoas que trabalham na sua equipa. Os tempos de M&A são sempre mais atribulados do que o normal. Entre processos de due diligence, apresentações, reuniões com novas pessoas, demonstrações de antigos e novos procedimentos, etc. etc. torna-se difícil estarmos fora do ambiente de trabalho nestas épocas. Por isso é bom estarmos renovados e com energia para estas fases que são bem desgastantes.
3° Conheça o meio de onde vem. É sempre bom refrescar os princípios da empresa onde trabalhamos antes das M&A's. Também os quadros e as pessoas que fazem parte dela. Assim podemos estar mais aptos a ter a nossa própria opinião sobre as mudanças que puderem acontecer e, eventualmente tomar melhores decisões. Também é bom sabermos bem o que andamos a fazer na nossa função. Conhecermos bem os processos e a nossa equipa é fundamental para estarmos preparados para eventuais mudanças. Nem sempre somos muito "velhos de casa" quando estas alterações acontecem. Nestes casos o melhor mesmo é estudar com mais afinco do que o normal o que temos em mãos.
4º Atualize-se! Como não é possível saber com antecedência o que vai acontecer, é bom rever o CV, LinkedIn e afins. Primeiro, porque normalmente deixamos sempre esse procedimento para as fases de "menor motivação" (ou quando estamos chateados com alguma decisão do chefe!). Segundo, porque normalmente sempre aparecem uns curiosos da empresa parceira para espiar o que andamos a fazer da vida. Por isso nada melhor do que ter as informações atualizadas. E terceiro porque se aparecer algum curioso externo também é bom ter as informações à mão com um nível mínimo de atualização. As oportunidades estão aí todos os dias e aparecem de repente. Nunca se sabe.
5º Converse com pessoas do setor. É bom conversar com pessoas das áreas onde trabalhamos para atualizar informações e discutir as novas tendências do mercado. Nestas fases é ainda mais importante interagirmos com este network. Também não custa nada o esforço.
6º Fale sempre muito com os seus colegas de trabalho. Principalmente se estiver numa função de liderança. As pessoas têm muitos receios nestas fases. Mui tas vezes muito mais receios do que nós próprios. Ou porque têm dependentes que precisam do salário mensal, do plano de saúde, porque estão a pagar estudos, porque têm medo de ficar sem trabalhar, enfim... npossibilidades que só quem passa por elas o sabe. Então tentar estar mais próximo das equipas sem o exagero de estar sempre a tocar no assunto é uma boa forma de diminuir a ansiedade de ambas as partes. Compartilhar as informações que não forem confidenciais também é bom. Sem medo de fofoca, sem mentiras e com profissionalismo acima de tudo. As pessoas gostam sempre de saber ou o que se passa, ou simplesmente que sejamos honestos e avisemos que não sabemos do que se passa! É exponencialmente mais difícil passar por processos de M&A quando as lideranças são fracas (garanto!).
7º Mantenha uma boa relação com fornecedores. Os fornecedores são muitas vezes uma das partes interessadas mais penalizada destes processos. Há sempre muitos interesses em jogo. Às vezes somos obrigados a deixar de trabalhar com um fornecedor, muitas vezes contra a nossa vontade, e a trabalhar com outras empresas que nem consideramos tão boas. E o rompimento às vezes é doloroso. Mas como a vida dá voltas (muitas mesmo!), é impossível dizermos "adeus" a este ou àquele fornecedor. O mesmo conselho dou a fornecedores. Às vezes levam demasiado a peito estas operações. Que jogue a primeira pedra quem nunca teve que voltar atrás para chamar alguma empresa que já dispensou antes!
8º Escolha as suas relações profissionais. Aproveite para descobrir quem mais admira profissionalmente, esta é uma boa fase para isso. Tive várias decepções e surpresas nestes processos. Não corte com pessoas que já lhe fizeram bem profissionalmente só porque tiveram que tomar alguma decisão mais drástica com você ou com alguém por quem você tem algum respeito profissional/pessoal. Entenda primeiro se foi uma decisão pessoal ou imposta e depois tire as suas conclusões. É difícil mas é possível...
9º Não deixe de focar no cliente. Apesar de todas as andanças que se passam nos bastidores, os clientes, sejam eles de qual setor forem (da indústria ao varejo), são sempre aqueles que não devem ser penalizados. Afinal, eles são fieis e estão ali para receber não menos do que a qualidade anterior que já era entregue. E são eles, na linha final da conta, que pagam o nosso salário.
10º Por fim, se tiver oportunidade, entenda a cultura da nova empresa. Sempre achei que devemos trabalhar para alguém e por alguma coisa que nos faça brilhar os olhos. Quando sofremos alterações na maneira de trabalhar ou de tomar as decisões nem sempre estamos alinhados com essa maneira de trabalhar. É quase como crença ou partido político. Acreditamos nesta ou naquela maneira de trabalhar e pronto! Logicamente temos que ser flexíveis para estarmos prontos para mudanças, mas não precisamos de atropelar os nossos princípios. Numa das minhas passagens por aquisição a mudança foi da "água para o vinho". Eu simplesmente não me identificava com a maneira de trabalhar da nova empresa. Para mim foi mais fácil para decidir que a nova fase da empresa poria fim ao meu ciclo por ali. O que quero dizer é que se isso lhe fizer sofrer e se tiver a possibilidade (sem desculpas e sem preguiças!) parta para o próximo desafio. Tenho certeza que será mais feliz e fará mais feliz as pessoas à sua volta. Se não tiver essa oportunidade e for daqueles que simplesmente não vão fazer parte da empresa nova reveja os 9 conselhos acima e vá à procura de alguma coisa que o faça feliz. Às vezes um empurrão é tudo o que é preciso para dar o passo na direção certa.